domingo, 21 de setembro de 2008

Do livro do poeta 6


I – Prelúdio: Entardecer na Cidade Feliz


Sagrado é o instante: pois existe a canção.
Nem de voz, nem de flauta se fez:
Só desta mão pousada no peito,
Sinal inconfuso do anseio.
No adeus ao Sol, qual um pássaro,
Demora-se a esperança do bem.
(Em que tom entardece a Cidade Feliz?)

Sereno é o desejo: pois existe a visão.
A oeste da perda, a leste dessa dor,
Descansa a paisagem-sorriso,
A sul e a norte da separação.
Da alegria de encontros: seus palácios;
Para todas as sedes: suas fontes...
(Em que olhar entardece a Cidade Feliz?)

Suave é o destino: pois existe a cidade-mulher.
De par em par, abrem-se os portões.
São asas prontas ao vôo,
São o vinho e o pão do peregrino.
No horizonte, o ouro envelhece,
No abraço, o mundo remoça...
(No tom de teu olhar, entardece a Cidade Feliz...)

sábado, 26 de abril de 2008

Do livro do poeta 5


A arte de ser


As cores suaves deste “ai...”
Dizem logo não haver lágrima.
De vera ilusão ela tece o dia
E a mesa posta guarda silêncio,
Até que a música diga “sim...”
A moça rara lê mais um livro.
Sendo amor e ideal mais que palavras,
A paisagem do mundo ganha cor
E a vida se mostra a arte de ser.

sábado, 5 de abril de 2008

Do livro do poeta 4



"O espírito da paz"

Agrada nela o passeio da Lua.
É promessa de sins duradouros.
A tristeza dos dias se assenta,
Se cala, à espera, ferida de paz.
Nasce, assim, a primeira canção.
Saltou os montes, à procura, a voz
E nesse encontro o mundo parou.

Certa manhã, o Sol descansou.
Entre nuvens, silente, parando,
Deixou a ela a missão: clarear
Toda alma que buscasse o ser
De luz que no querer se perdeu.
Tantas canções semeou, no olhar,
Que o vento, feminino, acolheu.

Nela a vida é meditação lunar.
Graça de pássaro, veio repousar.
Somada a beldade ao ar de certeza,
O encanto, só espírito, perdura.
Nasce, assim, a sétima canção.
Vestida de pérolas, a moça alvorece
— e o mundo, sereno, vai dormir...

Soneto de Gaspara Stampa (1524-1554)


SONETO CLXVI


Acuso Amor e aquele que amo tanto:
Amor, de me prender com nó tão forte,
Ele, de em vez de vida dar-me a morte
Ao furtar-se de mim por novo encanto.

Depois reflito e aos dois perdão garanto
E a mim mesma me culpo dessa sorte
Pois, sem forças que em meu socorro exorte,
Em mim descubro a causa de meu pranto.

Se um pouco mais tivesse de humildade
Em lugares talvez menos subidos
Poderia esperar maior piedade;

Faetonte, Ícaro e eu, por atrevidos,
— eu no presente, eles na Antigüidade —
Com fogo alto demais fomos punidos.

terça-feira, 11 de março de 2008

Do livro do poeta 3


"A canção de Apolo"

Paz argéntea, halo dourado,
Inscreveu o amor no dia
O signo em fogo da verdade.
Selou, sagrou, salvou.
Singrou os ares o navegante,
Resplandecendo-a toda: a vida.
Suprema, efémera: a dádiva.

Serena em cor e ávida
Do leite e mel em carícia,
Fez assim a canção de Apolo
Do receber e dar a ambrosia
A escorrer fecunda no afeto.
No deserto a flor, no silêncio a voz:
E no mundo o querer, ter e ser.

Tranqüila no diálogo das almas,
A brilhantíssima paixão: só os dois.
E nunca mais são sós...
Corre claro o vinho, partem o pão.
Jorram as notas. Desfeita a névoa,
É fatalmente azul a música:
E a Musa liberta o riso e a si.

sábado, 1 de março de 2008

Do livro do poeta 2


"Sete planetas de luz"

Teu coração, pés sobre o solo:
Escrevendo a raça,
O rosto, o gosto
Duma suave humanidade.
A técnica, o ritmo
Da atmosfera jazz
Marcando pela passagem
Faces famintas de ar.
E é um gesto que traça,
Tanta saudade,
O teu destino clássico:
Do cair de teu corpo
Surgem, aqui e ali,
Desafios de dança,
Sete planetas de luz.
Reggae, blues
Gospel, soul
Samba, funk
Jazz.
Abraços de eternidade.




(do livro Oceano dos meus dias)

Do livro do poeta


"Vénus sorrindo"

Eu te saúdo, delicadamente.
Eu te abençôo, humildemente.
Eu te escuto, profundamente.
Eu te aquieto, serenamente.
Eu te abraço, calorosamente.
E te recebo, humanamente.

Assim disse Apolo: e Vénus sorriu.


(do livro Poemas de Portugal e Espanha)

Camões + Botticelli = Beleza


Quem vê, Senhora, claro e manifesto

o lindo ser de vossos olhos belos,

se não perder a vista só em vê-los,

já não paga o que deve a vosso gesto.


Este me parecia preço honesto;

mas eu, por de vantagem merecê-los,

dei mais a vida e alma por querê-los,

donde já me não fica mais de resto.


Assi que a vida e alma e esperança

e tudo quanto tenho, tudo é vosso,

e o proveito disso eu só o levo.


Porque é tamanha bem-aventurança

o dar-vos quanto tenho e quanto posso,

que, quanto mais vos pago, mais vos devo.

Boas-vindas!

Tudo azul?
Sinta-se em casa. Aqui você vai encontrar os poemas mais bonitos que já escrevi ou li, selecionados para fazer valer o momento que você lhes dedicar...

C. F.